Charles Oliveira
Charles Oliveira, conhecido como “Do Bronx”, é uma das figuras mais inspiradoras do esporte das artes marciais mistas. Nascido nas ruas duras de uma favela brasileira, ele transformou adversidades em vitórias dentro do octógono. Com um estilo de luta que mistura a ferocidade do muay thai com a precisão letal do jiu-jitsu brasileiro, Oliveira não é apenas um atleta de elite, mas um símbolo de superação para milhões de jovens em todo o país. Sua jornada, repleta de reviravoltas, recordes e momentos de glória, continua a cativar fãs ao redor do mundo. Nesta reportagem, mergulhamos na vida e na carreira desse fenômeno do MMA, destacando sua evolução e os capítulos mais recentes de sua história.
Infância nas Ruas de Guarujá: As Raízes de um Campeão
Uma Infância Marcada por Desafios
Charles Oliveira da Silva veio ao mundo em 17 de outubro de 1989, na favela do Vicente de Carvalho, em Guarujá, litoral de São Paulo. Crescer em um ambiente como esse não era fácil. A família de Oliveira enfrentava dificuldades financeiras constantes, e o jovem Charles, o caçula de nove irmãos, via os pais lutando para colocar comida na mesa. Aos sete anos, um diagnóstico de sopro no coração e febre reumática mudou tudo: os médicos recomendavam que ele evitasse esportes para não agravar a condição. Mas Oliveira, com a teimosia que o definiria anos depois, não se rendeu. Seus pais, vendo a melhora gradual do filho, permitiram que ele explorasse o mundo das lutas.
A favela, com suas ruas de terra batida e o som constante de crianças brincando apesar das privações, moldou o caráter de Charles. Ele ajudava a família vendendo lanches na praia e coletando papelão para reciclagem. Esses anos de esforço precoce ensinaram-lhe o valor do trabalho duro e a importância da resiliência. “Eu via o mundo como uma luta diária, e isso me preparou para o octógono”, diria ele em uma entrevista anos depois. Foi nesse contexto que, aos 12 anos, um vizinho o levou a uma academia de jiu-jitsu, mudando o rumo de sua vida para sempre.
O Encontro com o Jiu-Jitsu: Um Portal para o Futuro
A academia de Roger Coelho, em Guarujá, era um oásis em meio ao caos. Coelho, um treinador experiente, oferecia aulas gratuitas para crianças de baixa renda, e Oliveira agarrou a oportunidade com unhas e dentes. Em apenas dois meses de treino, ele já conquistava o campeonato paulista de jiu-jitsu na faixa azul. A gratidão do garoto era imensa: “O jiu-jitsu me salvou da rua”, confidenciou ele. Seus pais, orgulhosos, continuavam a apoiar, mesmo que isso significasse sacrificar refeições.
Esses primeiros contatos com o tatame não eram só sobre técnica; eram sobre disciplina e autoconfiança. Oliveira treinava horas a fio, absorvendo lições que iam além das chaves de braço e das finalizações. Aos 15 anos, ele já competia em torneios regionais, acumulando medalhas que enfeitavam as paredes humildes de sua casa. Essa fase inicial, cheia de vitórias modestas, plantou as sementes de um campeão que usaria o jiu-jitsu como base para dominar o MMA.
Os Primeiros Passos no Jiu-Jitsu Brasileiro: De Azul a Faixa-Preta
Conquistas Precoces e Evolução Técnica
O talento de Oliveira para o jiu-jitsu era inegável. Em 2004, ele venceu o campeonato paulista pela segunda vez, consolidando-se como uma promessa local. No ano seguinte, a Copa Nação Jiu-Jitsu caiu em suas mãos, e em 2006, ele somou 16 medalhas em competições variadas. Como faixa azul em 2007, Oliveira brilhou no Mundial CBJJE, tornando-se bicampeão mundial. Sua ascensão continuou em 2008, quando, já na faixa roxa, conquistou o vice-campeonato no Mundial CBJJE e o título sul-americano da CBJJE.
Esses anos foram de aprendizado intenso. Treinado por Coelho, Oliveira desenvolveu uma guarda versátil e um instinto afiado para transições. Ele recebia suas faixas de Coelho até a marrom, mas em 2010, sob a orientação de Ericson Cardoso e Jorge “Macaco” Patino, alcançaria a faixa-preta – um marco que o colocava entre os melhores do Brasil. Anos depois, em 2023, ele chegaria à faixa-preta de quarto grau, um testemunho de sua dedicação contínua.
Transição para o Grappling Profissional
Mesmo com o foco no MMA, Oliveira nunca abandonou as raízes no jiu-jitsu. Em janeiro de 2020, ele venceu um superfight de grappling contra Lucas Barros no SFT 20, por decisão sob regras IBJJF. Em agosto de 2023, enfrentou Cristiano Souza no Gold Talents BJJ 2, mantendo sua forma impecável. Um duelo com Renan Barão foi anunciado para um evento BJJ Stars, mostrando que, mesmo no auge do MMA, ele respeitava o tatame puro.
Além disso, Oliveira conquistou o prajied preto em muay thai, integrando golpes de joelhada e cotovelada ao seu arsenal de submissões. Essa fusão de estilos o tornaria único: um grappler que finalizava de pé ou no chão, sempre com pressão implacável.
Entrada no MMA Profissional: As Batalhas Iniciais
Estreia Amadora e Profissional
Aos 17 anos, em 2007, Oliveira estreou no MMA amador, finalizando Rui Machado com um armlock em apenas 15 segundos no Circuito Nacional de Vale-Tudo Amador. Essa vitória rápida sinalizava o potencial explosivo do garoto. Em março de 2008, ele virou profissional no Predador FC 9, onde venceu o Grand Prix de meio-médio em uma noite memorável: submissão por mata-leão em Jackson Pontes, TKO por socos em Viscardi Andrade e outro TKO em Diego Braga.
Sua estreia nos leves veio em dezembro de 2008, com um TKO sobre Mehdi Baghdad no Kawai Arena 1. No Korea Fight, ele nocauteou Daniel Fernandes e finalizou Elieni Silva com joelhada e socos. Uma sequência de submissões seguiu: anaconda choke em Alexandre Bezerra e decisão dividida sobre Eduardo Pachu. Em fevereiro de 2010, Oliveira lutou duas vezes na mesma noite, submittindo Rosenildo Rocha e nocauteando Diego Battaglia com um slam.
O Recorde Invicto Pré-UFC
Antes de assinar com o UFC, Oliveira acumulou 12 vitórias em 12 lutas, com seis nocautes e cinco submissões. Ele competiu em três ocasiões com múltiplas lutas na mesma noite, demonstrando resistência sobre-humana. Esses anos iniciais, entre 2007 e 2009, foram de consolidação: de um garoto da favela a um predador invicto, pronto para o maior palco do MMA.
A Chegada ao UFC: Desafios e Adaptações
Primeiras Lutas e o Batismo de Fogo
Em 2010, Oliveira assinou com o UFC e estreou em 1º de agosto no UFC Live: Jones vs. Matyushenko, finalizando Darren Elkins com um triangle armbar em 41 segundos – Prêmio de Submissão da Noite. Em setembro, no UFC Fight Night 22, ele submittiu Efrain Escudero por mata-leão em um combate de peso combinado, outro bônus de submissão. Mas a primeira derrota veio em dezembro, no UFC 124, por kneebar de Jim Miller.
Em 2011, uma luta com Nik Lentz no UFC Live: Kongo vs. Barry terminou em no contest por joelhada ilegal, rendendo Luta da Noite. Ele perdeu por TKO para Donald Cerrone no UFC on Versus 5. Essas reveses não abateram Oliveira; elas o forjaram.
Mudanças de Peso e Lições Aprendidas
Em 2012, Oliveira desceu para os penas, finalizando Eric Wisely com um calf slicer no UFC on Fox: Evans vs. Davis – a primeira finalização desse tipo na história do UFC, com bônus de submissão. Ele submittiu Jonathan Brookins com anaconda choke no The Ultimate Fighter 15 Finale, mas foi nocauteado por Cub Swanson no UFC 152.
Em 2013, perdeu por decisão unânime para Frankie Edgar no UFC 162, Luta da Noite. Lesões o tiraram de combates contra Estevan Payan e Jeremy Larsen. Em 2014, ele voltou forte: triangle choke em Andy Ogle no UFC Fight Night 36 (Performance da Noite), anaconda choke em Hatsu Hioki no UFC Fight Night 43 (primeira finalização de Hioki, outro bônus) e decisão unânime sobre Jeremy Stephens no The Ultimate Fighter 20 Finale, após errar o peso.
Problemas com corte de peso o afetaram: em 2015, guilhotina em Nik Lentz no UFC Fight Night 67 (Performance e Luta da Noite), mas TKO para Max Holloway no UFC Fight Night 74 por lesão no esôfago. Ele finalizou Myles Jury com guillhotina no UFC on Fox 17, após outro erro de peso.
Ascensão e Recordes Inquebráveis: O Domínio dos Leves
2016-2018: Reerguimento e Mudanças
Em 2016, submissões para Anthony Pettis e Ricardo Lamas o desafiaram. Em 2017, mata-leão em Will Brooks no UFC 210 (Performance da Noite), mas TKO para Paul Felder no UFC 218. Em 2018, Oliveira se juntou à Chute Boxe Diego Lima para aprimorar o striking. Ele finalizou Clay Guida com guillhotina no UFC 225 (Performance), Christos Giagos com mata-leão no UFC Fight Night 137 (12ª submissão, recorde) e Jim Miller com mata-leão no UFC on Fox 31 (13ª submissão, sétimo bônus de Performance).
2019-2020: Sequência de Finalizações
Em 2019, anaconda choke em David Teymur no UFC Fight Night 144 (14ª submissão), TKO em Nik Lentz no UFC Fight Night 152 e KO em Jared Gordon no UFC Fight Night 164 (Performance). Em 2020, guillhotina em Kevin Lee no UFC Fight Night 170 (15ª submissão, empatando recorde de finishes com 16), decisão unânime sobre Tony Ferguson no UFC 256 e retirada de luta com Beneil Dariush.
Oliveira acumulava recordes: mais submissões (16), mais finishes (20) e mais bônus (20) no UFC.
Conquista do Título dos Leves: O Momento de Glória
UFC 262: O TKO Histórico
Em 2021, Oliveira conquistou o cinturão vago dos leves no UFC 262, com TKO por socos em Michael Chandler (Performance da Noite, 17º finish). Ele defendeu contra Dustin Poirier no UFC 269, com mata-leão (Performance, 12º bônus desse tipo, recorde).
A Noite Conturbada do UFC 274
Em 2022, após errar o peso (155.5 lb), Oliveira foi despojado do título antes da luta, mas submittiu Justin Gaethje com mata-leão no UFC 274 – terceiro lugar no Bônus de Fãs.
Defesas e Desafios: Altos e Baixos
Perda do Título e Recuperação
No UFC 280, Oliveira perdeu o cinturão vago por arm-triangle choke para Islam Makhachev. Em 2023, TKO em Beneil Dariush no UFC 289 (Performance, 20º finish). Lesão o tirou da revanche com Makhachev no UFC 294.
Em 2024, decisão dividida para Arman Tsarukyan no UFC 300 e vitória unânime sobre Chandler no UFC 309 (Luta da Noite).
Lutas Icônicas: Momentos que Definiram uma Carreira
As Finalizações Lendárias
Lutas como o calf slicer em Wisely (2012), anaconda em Hioki (2014) e guillhotina em Poirier (2021) entraram para a história. O TKO em Chandler (2021) gerou 300 mil buys de PPV, enquanto o UFC 269 ultrapassou 500 mil.
Recordes e Premiações
Oliveira é detentor de mais submissões (16), finishes (20) e bônus (20) no UFC. Ele ganhou o ESPY de Melhor Lutador de MMA em 2022, Submission do Ano em 2021-2022 e Lutador do Ano pela Sherdog em 2021.
Vida Pessoal e Legado Social: Além do Octógono
Família e Fé
Casado e pai de três filhos, Oliveira reside em Guarujá, perto de sua infância. Cristão devoto, ele fez cirurgia nos olhos em 2022 para corrigir miopia. Fã de corridas de harness, venceu uma em 2021, e é embaixador do Corinthians desde 2021.
O Instituto Charles do Bronx
Fundado em 2012, o ICBronxs oferece jiu-jitsu gratuito, educação e nutrição para jovens da favela. Em 2025, ele recebeu o Prêmio Comunitário Forrest Griffin do UFC por esse trabalho transformador.
Em fevereiro de 2023, Oliveira entrou no OnlyFans para compartilhar treinos. Seu apelido “Do Bronx” homenageia as favelas.
Atualizações Recentes: 2024-2025, Um Ano de Intensidade
Derrota no UFC 317 e Honrarias
Em junho de 2025, Oliveira desafiou pelo cinturão vago dos leves no UFC 317, mas foi nocauteado por Ilia Topuria. Apesar da perda, sua performance foi elogiada pela resiliência. No mesmo ano, o anúncio de um biopic sobre sua vida, produzido por Eduardo Ferro e filmado no Brasil e Las Vegas, emocionou fãs. A 405 Films capturará sua jornada da favela ao topo.
O Prêmio Comunitário e Reflexões
O UFC Forrest Griffin Community Award de 2025 reconheceu o impacto do ICBronxs, que já beneficiou centenas de crianças. Oliveira refletiu: “O cinturão é passageiro; o legado é eterno.”
A Luta de Hoje: Oliveira vs. Gamrot
Nesta noite de 11 de outubro de 2025, no Farmasi Arena, no Rio de Janeiro, Oliveira enfrenta Mateusz Gamrot na luta principal do UFC Fight Night. Após a lesão de Rafael Fiziev, Gamrot assumiu, prometendo um confronto de alto nível. Oliveira, embalado pelo apoio da torcida brasileira, visa um nocaute ou finalização – “Não vai pra decisão”, declarou ele. Uma vitória poderia empatar o recorde de Mirko Cro Cop com mais finishes na era Zuffa. O evento, com preliminares já rolando, marca o retorno de Oliveira à sua terra natal, onde ele é recebido como herói.
Em entrevistas recentes, Oliveira comentou sobre um possível superduelo entre Alex Pereira e Jon Jones em 2026: “Pereira pode nocautear Jones nos pesos-pesados”. Sua confiança reflete o fogo que ainda queima.
O Futuro de Charles Oliveira: Horizonte Aberto
Aos 35 anos, Oliveira segue ranqueado #4 nos leves. Com 35 vitórias, 11 derrotas e 1 NC (23-11-1 no UFC), ele planeja mais corridas pelo título. Seus treinos na Chute Boxe continuam intensos, misturando muay thai agressivo com jiu-jitsu elite. Fãs especulam sobre rematches com Tsarukyan ou Makhachev, mas Oliveira foca no presente: “Cada luta é uma chance de inspirar”.
Conclusão: Um Ícone Eterno
Charles Oliveira transcende o MMA. De um menino com coração fraco na favela a campeão do mundo e filantropo, sua história é um hino à perseverança. Com recordes que podem durar gerações e um legado social profundo, “Do Bronx” prova que as maiores vitórias vêm das origens mais humildes. Enquanto o octógono o espera esta noite, o mundo assiste, inspirado por esse guerreiro brasileiro que nunca desiste.